O deputado federal Daniel Barbosa escreveu um artigo sobre o Dia Internacional da Mulher, enaltecendo personalidades alagoanas de diversas áreas, a exemplo de Nise da Silveira, Lili Lages, Linda Mascarenhas, Anilda Leão, Jarede Viana, Almerinda Gama e Ceci Cunha.


O texto, que é um breve contexto histórico sobre luta das mulheres contra a desigualdade de gênero, pode ser conferido na íntegra abaixo:


O ÁRDUO CAMINHO DA LUTA PELA IGUALDADE


Daniel Barbosa


Era outono e fazia frio quando a carroça do carrasco Charles-Henry Sanson cruzou as ruas de Paris em direção à Praça da Revolução. O calendário marcava 3 de novembro de 1793 e a dramaturga e ativista francesa Olympe de Gouges, condenada pelo Tribunal Revolucionário sem uma defesa justa, seguia para o patíbulo. Horas depois a lâmina pesada da guilhotina cortaria a cabeça daquela que seria considerada a pioneira do feminismo.


A mulher nasce livre e tem os mesmos direitos do homem. Assim começava a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, panfleto de autoria de Olympe de Gouges, publicado em 1791, no centro de um dos movimentos revolucionários mais significativos da história. A ousadia de questionar a República Jacobina e reivindicar a emancipação feminina lhe custou a vida. Hoje, seu busto em mármore está na Assembleia Nacional da França e em Paris há uma praça com seu nome.


A luta dos movimentos feministas vem de longe e os caminhos nunca foram fáceis. A Assembleia Geral da ONU proclamou o ano de 1975 como o Ano Internacional da Mulher, promovendo ações em prol da igualdade de direitos, oportunidades e tratamento entre homens e mulheres. Em 1977, a ONU oficializou 8 de março como o Dia Internacional da Mulher.


O objetivo é celebrar as conquistas e propor soluções para superar os obstáculos que ainda atrapalham a igualdade social e de direitos entre os sexos. Afaste-se qualquer pensamento absurdo de que se trata de uma concessão feita às mulheres. São conquistas duramente obtidas para corrigir uma antiga, injusta e muitas vezes cruel estrutura patriarcal.


Ao discursar na ONU, em 2013, Malala Yousafzai, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz aos 17 anos de idade, lembrou que, ao assumirem a luta, o tempo em que as mulheres pediam aos homens para lutar pelos direitos delas ficou para trás.


Não existe democracia sem participação popular e muito menos sem participação feminina. As mulheres brasileiras tiveram coragem para ocupar o espaço cívico. A primeira eleitora do Brasil foi a professora Celina Guimarães, que se alistou em 1927, no Rio Grande do Norte. A professora Carlota Pereira de Queirós foi a primeira brasileira eleita deputada federal, em 1934. Também professora, Antonieta de Barros se elegeu deputada estadual em Santa Catarina, sendo a primeira mulher negra a assumir e exercer um mandato eletivo, no período de 1934 a 1937.


A professora Eunice Michiles foi a primeira senadora, em 1979. Após cumprir o mandato, se elegeu deputada federal pelo Amazonas e participou da Assembleia Nacional Constituinte de 1987. Iolanda Fleming, professora, foi a primeira governadora de um estado brasileiro, o Acre. Dilma Roussef foi a primeira presidente da República, eleita em 2010 e reeleita em 2014. Em 2019, Joênia Wapichana foi a primeira indígena a tomar posse como deputada federal.


Bertha Lutz, diplomata brasileira, se destacou como uma das mais notáveis líderes na luta pelos direitos políticos das mulheres. Sua atuação na Conferência de São Francisco, nos Estados Unidos, foi decisiva para a previsão da igualdade de direitos entre homens e mulheres na Carta das Nações Unidas, de 1945.


Em 1827, as mulheres brasileiras passaram a frequentar colégios e ir além da escola primária. Em 1879, conquistam o direito ao ensino superior. Em 1910, a professora Leolinda Daltro e a poetisa Gilka Machado fundam o Partido Republicano Feminino e três jornais dedicados às mulheres. O Código Eleitoral de 1932 garantiu às brasileiras o direito ao voto. Na França, conhecida como berço do feminismo, esse direito só foi instituído em 1944.


Outros avanços merecem referência. O Estatuto da Mulher Casada, de 1962, entre outros pontos, acabou com a exigência da autorização do marido para trabalhar. Em 1988 a Constituição Federal reconheceu a igualdade de direitos entre homens e mulheres. Em 2006 veio a Lei Maria da Penha e em 2015 a Lei do Feminicídio. Em 2018 a importunação sexual feminina foi tipificada como crime. Em 2021 foram instituídas regras para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher.


Alagoas foi importante nesse caminho. Podemos citar, entre outros nomes que contribuíram com coragem, inteligência e abnegação para causa feminina, cada uma a seu modo: Nise da Silveira, Lili Lages, Linda Mascarenhas, Anilda Leão, Jarede Viana e a jornalista Almerinda Gama.


Em Arapiraca, com os esforços de Luciano Barbosa foi instituído o Memorial da Mulher. Inaugurado em 2008, se consolidou como espaço de preservação da trajetória de mulheres arapiraquenses que tiveram destaque no desenvolvimento político e sociocultural de Alagoas, a exemplo de Ceci Cunha e Célia Rocha.


Ao lado dos nomes citados neste artigo, deve-se aplaudir a atitude de milhões de mulheres, anônimas, que mesmo em situação de vulnerabilidade não se intimidaram e se opuseram ao preconceito, ao machismo, à misoginia e à violência doméstica.


Não obstante as relevantes conquistas alcançadas na luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, é preciso ir além. Ir além no mercado de trabalho, abrangendo desde a necessidade de maior representatividade nos postos de liderança nas empresas até a eliminação da discrepância salarial entre os sexos. Observa-se, ainda, que as mulheres negras são vítimas de dupla discriminação, tornando mais abjeto o tratamento desigual.


Registre-se que as mulheres representam 70% dos trabalhadores de saúde no mundo e foram verdadeiras heroínas no momento mais grave da pandemia de 2020. Elas também fazem o triplo do trabalho não remunerado de cuidados prestados pelos homens.


Apenas em 1979 as mulheres garantiram o direito de jogar futebol. Agora em 2023 haverá a Copa do Mundo de Futebol Feminino na Austrália e Nova Zelândia, com 32 seleções. O Brasil mais uma vez estará na disputa, com a alagoana Marta, desde sempre a melhor do mundo. Natural de Dois Riachos, Marta Vieira da Silva é Embaixadora da Boa Vontade da ONU Mulheres e Defensora dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.


É fundamental abrir mais espaços até alcançar a desejada igualdade de direitos e oportunidades entre homens e mulheres, sem qualquer discriminação. Por outro lado, é indispensável festejar os avanços obtidos, de olho nos processos de degradação da democracia, que precisam ser repelidos em sua origem pois, como advertiu Edgard Morin, nenhuma conquista histórica é irreversível. Daí a importância do Dia Internacional da Mulher.


Daniel Barbosa é publicitário e deputado federal por Alagoas.